Janeiro está perto. As moções
podem chegar a qualquer momento. Saiba que nada é por acaso. Absolutamente
nada. A música caribenha que toca faz mexer uma parte de mim que estava
esquecida. Como é bom dançar. É antigo o ato de dançar e é animalesco. Aquela
sensação de ter se apaixonado a primeira vista e de ter deixado o momento
passar. O vazio que me deixa. Por quê? Por quem? O silêncio que incomoda.
Porque muito se diz nesse espaço. O teto de zinco está furado. Agora que começa
a chover lá fora. Daqui ha pouco as gotas molharão tudo. Mas a questão é
justamente a sobreposição das águas. A mão na boca, lambendo os dedos, é tão
bom comer aquilo que você gosta. Mas comer com as mãos. Lambuzar. Já se
infiltra. Escorre pelas paredes. Pelo menos a parte em que está a rede não
molha e posso ficar ali, balançando. A dor e o choro. A chuva. O sal faz boiar.
Mas não há água suficiente para isso. Engole o choro, levando a mão na boca com
o capitão de arroz e carne seca. Uma pena que vai estragar os quadros. Resgatei-os
do lixo. Mas ficaram tão bem onde estão. Não é bem o céu tudo isso, mas tem
chuva. Rio. Ainda não perdi a capacidade de rir de mim, das besteiras todas que
penso e falo para as paredes. Só. E o vazio que me deixa. Se amanhã fizer sol
trato de consertar esse telhado. Enquanto isso, balanço. A música
porto-riquenha não para de tocar. Ou é caribenha? Não importa. Agora já não
importam as definições. Se é chuva ou choro, no fim tudo está molhado. E pronto.
E ponto.