quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Eu via, lia, esboçava, pensava, amava, sentia.




Aquela imagem não me sai do pensamento. Enquanto eu a olhava, minha memória viajava, vagueava por caminhos um tanto distantes. Por vezes, queria se prender ao passado, porque a sensação viva latejava, consumia, sentia prazer, amava incondicionalmente, como hoje ainda ama, aqui, sem sair de si, apenas lembrando, mas ama um amor tão pleno, sem desgostos, queimando sem machucar, sem ciúme, sem apego de querer só para si. Aquela imagem não era apenas uma imagem, mas o desenho perfeito, o rabisco imaginário presente, o corpo, a alma, a representação do carinho, o sorriso manso, algumas vezes desafiador. Seu jeito ativo, altivo, sua voz limpa, suas palavras novas em meu vocabulário, a forma como ri quando beijo-lhe o pescoço, porque sente cócegas. O tempo vai passando e a distância me faz rever, buscar sempre a sua imagem, porque sempre que me olho no espelho, vejo-me vendo, vejo-me ela, vejo-me sendo o seu jeito de encarar o mundo e as pessoas, vejo-me seu. Um dia eu não terei mais que essa imagem, porque não foi nos dado o poder de estar sempre de forma física, constante, mas a imagem, ah essa imagem! Rainha de tudo que cabe em mim e o que transcorre, evapora, escorre, salta. Ontem tive um sonho e era tão real, ela chegou perto da porta e disse: “Neto, corre ali, pega aquela galinha, porque a água já está fervendo.” E eu, sabido, danado, feliz pela missão dada, corria, cansava a mim e a galinha, mas a pegava. E no sonho tinha os pés de São João floridos num amarelo marcante, tinha o cheiro do fogo de lenha queimando na cozinha com pouca luz, tinha o gosto da gemada tomada um pouco mais cedo. Aquela imagem está viva, rica de detalhes, eu via, lia, esboçava, pensava, amava, sentia. E tudo isso também em presente, como presente recebido em dia de aniversário, em todo dia que é dia de tê-la como minha, como nossa. E acordei quando lhe tomava a benção e ela, forte em si, em tudo, respondeu-me: Deus te abençoe.


A vovó Lilita, Rainha de mim.

3 comentários:

eunucoeununca disse...

A rainha de todos nós. Viva a vovó, que nos surpreende positivamente. Sempre!
A minha vida se servisse para algo, à ela daria. Faço minha as sua doces palavras. Beijos. Ellen.

Unknown disse...

Ai menino assim você me "mata"!
Sinto muita emoção nesse momento. Só você sendo tão cheio de amor e sensibilidade para escrever algo assim... sublime.

Unknown disse...

Muito, muito, muito bom.

Parte de mim - o que vira escrita...

Os que me olham, me sentem e me acomapanham

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